quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Chico


de olhar, indicador e anelar atentos percorro as estantes
littérature française, oui, c'est ça, le français me manque un peu parfois
peut être un livre français
oui
le petit prince
c'est parfait
o principezinho
há quanto tempo ando para o ler, como é que ainda me continua a escapar
sim, o principezinho, na língua original
olhar, indicador e anelar novamente atentos
não tem...
...
inglês...
só títulos em jeito de pacote de leite descartável
olhar, indicador e anelar recolhidos
mãos estendidas
salta-me Benjamim
ainda vou a tempo de as fechar
o escritor encontra o compositor pela via do lirismo, e o resultado não é só alta literatura, mas também uma poesia dolorosa, uma quase-música que embala e comove, diz o Folha de S. Paulo
gosto
trago

no dia em que escrevesse um livro seria assim, carregado de incondicionais, mudanças, enumerações, descrições belas ora depressa, ora devagar, domínio absoluto do ritmo diria o Folha, concordaria

Ele é Benjamim, Chico Buarque, belo, belo

uma espreitadela..

  Benjamim retoma o radiotáxi com Ariela e sente-se provinciano em seu traje completo. Ela, de short e camiseta, deixa claro que nunca se acanhou com restaurantes de luxo; a um maître exótico, terá autoridade para ordernar um filé com fritas. No centro do banco, como baliza a separá-los, Ariela finca a bolsa de lona cilíndrica, de cuja boca sobressai um prospecto afunilado. Talvez temesse que Benjamim alisasse a penugem de suas pernas, que ela cruza sobre o banco como um iogue, tendo largado as sandálias no chão do carro. E Benjamim deveras contempla aquela trança de pernas, aquelas polpas que às vezes lhe parecem uma ninhada na bacia de Ariela. Ela traz as mãos espalmadas sobre os joelhos e, contra o prognóstico de Benjamim não usa batom. Exibe cada ângulo do seu rosto lavado, girando-o em todas as direções, à maneira de turista chegando do aeroporto. De quando em quando repousa os olhos em Benjamim, como numa árvore, depois sorri sem abrir a boca e volta a apreciar o comércio. Às margens de um horto Benjamim fala "exuberante vegetação", e a declaração fica boiando no interior do radiotáxi silenciosa até a porta do restaurante. Benjamim dá um salto ágil e contorna o carro para apear Ariela, porque o porteiro de luvas está atendendo uma limusine.

domingo, 24 de outubro de 2010

Parabéns, senhor engenheiro

...ou a minha vénia à rádio e ao bom jornalismo.


Desde há algum tempo que o Sinais é, para mim, provavelmente, o programa de rádio mais notável a circular nas nossas ondas hertzianas. A este, juntar-lhe-ia ainda o Governo Sombra e o delicioso Pessoal... e Transmissível para formar um leque que me dá verdadeiro prazer de ouvir, guardar e manter por perto.

(Em comum têm todos o facto de pertencerem à TSF, uma rádio que certamente ouviria muito mais amiúde não fossem os horrendos intervalos para publicidade colocados no ar uns bons 10 decibéis acima da restante emissão.)

Ao Fernando Alves e ao Carlos Vaz Marques a minha vénia sentida, o meu obrigado pelo trabalho que desenvolvem. Sobre os programas a minha recomendação viva: oiçam:)

Para exemplo, notável e tão actual, o Sinais do último dia 15, Parabéns, senhor engenheiro. 

(Ah, e do 'Pessoal', de repente, sei lá, LlosaA. MaloufBruno Aleixo :p )

sábado, 9 de outubro de 2010

Mariza, num conjunto de doze grandes mulheres, de água, com Limón


Mariza e Javier Limón são velhos amigos e "companheiros de estrada" (para puxar aqui a brasa ao nome do blog): J.Limón tinha já sido o produtor do último álbum de Mariza, "Terra". Voltam agora a juntar-se num projecto concebido por J. Limón que junta e presta homenagem às mulheres e vozes da bacia do Mediterrâneo. Vi Limón contar, numa entrevista, que lhe ficou a faltar a participação de uma grande voz Iraniana --- das mais belas do mundo, contava. Que tentou, mas cantar em público é, no Irão, interdicto às mulheres lá nascidas. Deixou-lhes a dedicatória do álbum. Deixa-nos doze grandes canções, por doze grandes vozes, Mariza, Aynur, La Susi, Estrella Morente, Carmen Linares, Concha Buika, Montse Cortés, Sandra Carrasco, La Shica, Yasmin Levy, Eleftheria Arvanitaki e Genara Cortés.

domingo, 20 de junho de 2010

Vem, Que Te Chamei


Eu chamei-te para ser
Sophia de Mello Breyner Andresen
Coral

Eu chamei-te para ser a torre
Que viste um dia branca ao pé do mar.
Chamei-te para me perder nos teus caminhos.
Chamei-te para sonhar o que sonhaste.
Chamei-te para não ser eu:
Pedi-te que apagasses
A torre que eu fui a minha vida os sonhos que sonhei.

sábado, 8 de maio de 2010

Um predador. Uma delícia. valter hugo mãe em pessoa.

Foi na Póvoa do Varzim, no passado mês de Fevereiro---sim, faço parte do grupo daqueles que ainda acham relevante uma boa notícia mesmo com mais que uns quaisquer 20 segundos de antiguidade; afinal é da soma do seu trajecto que se constrói a identidade de um povo, mas voltemos ao ponto de partida---que um grupo de criadores portugueses, com uma bem-vinda intromissão espanhola, se juntou à volta de uma mesa a pretexto do tema "o poeta é um predador".

Há dias, a antena2, n’a força das coisas, teve a bonita ideia de nos recordar o que por lá se disse.

E servem estas palavras para introduzir um dos pontos altos do evento, o predador valter hugo mãe, uma delícia de prosa que aqui deixo em versão áudio. Palavras proferidas pelo próprio autor. Um prazer de escuta. Sente-se, relaxe, e, espero, aprecie:)

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A versão em texto pode ser encontrada aqui.

sábado, 24 de abril de 2010

Um pé no fundo do mar...

Navegando pela história do meu querido país de fundação e passado acutilantes, descobri que, chegados a Abril de 2010, determinou-se que oferecer 200000 euros a um político para influenciar a sua decisão sobre determinado assunto não é crime.

Reza a história de tal acontecimento que o acto em causa “não preenche a factualidade típica do crime de corrupção activa de titular de cargo político”.

"Típica"?

"Típica"??

...

"Típica"??????????????????????????

Ahhh.. então é isso, está tudo bem e somos todos bons rapazes, honestos e inocentes, porque não seguimos o procedimento típico!

Quais torres eólicas e Magalhães (desculpa Fernão, não é para ti), na ?justiça? sim, estamos, de facto, na vanguarda da inovação!

Deixo, peço desculpa pela linguagem, a minha opinião sincera sobre o assunto:

Foda-se! 
Mas o que é isto?!?


sexta-feira, 23 de abril de 2010

Em homenagem à Bandeirinha:)


Calçada de Carriche
António Gedeão


Luísa sobe, sobe a calçada,
sobe e não pode que vai cansada.

Sobe, Luísa, Luísa, sobe,

sobe que sobe sobe a calçada.

Saiu de casa

de madrugada;
regressa a casa
é já noite fechada.
Na mão grosseira,
de pele queimada,
leva a lancheira
desengonçada.

Anda, Luísa, Luísa, sobe,

sobe que sobe, sobe a calçada.

Luísa é nova,

desenxovalhada,
tem perna gorda,
bem torneada.
Ferve-lhe o sangue
de afogueada;
saltam-lhe os peitos
na caminhada.

Anda, Luísa. Luísa, sobe,

sobe que sobe, sobe a calçada.

Passam magalas,

rapaziada,
palpam-lhe as coxas
não dá por nada.

Anda, Luísa, Luísa, sobe,

sobe que sobe, sobe a calçada.

Chegou a casa

não disse nada.
Pegou na filha,
deu-lhe a mamada;
bebeu a sopa
numa golada;
lavou a loiça,
varreu a escada;
deu jeito à casa
desarranjada;
coseu a roupa
já remendada;
despiu-se à pressa,
desinteressada;
caiu na cama
de uma assentada;
chegou o homem,
viu-a deitada;
serviu-se dela,
não deu por nada.

Anda, Luísa. Luísa, sobe,

sobe que sobe, sobe a calçada.

Na manhã débil,

sem alvorada,
salta da cama,
desembestada;
puxa da filha,
dá-lhe a mamada;
veste-se à pressa,
desengonçada;
anda, ciranda,
desaustinada;
range o soalho
a cada passada,
salta para a rua,
corre açodada,
galga o passeio,
desce o passeio,
desce a calçada,
chega à oficina
à hora marcada,
puxa que puxa, larga que larga [x 4]
toca a sineta
na hora aprazada,
corre à cantina,
volta à toada,
puxa que puxa, larga que larga [x 4]

Regressa a casa

é já noite fechada.
Luísa arqueja
pela calçada.

Anda, Luísa, Luísa, sobe,

sobe que sobe, sobe a calçada [x 3]

Anda, Luísa, Luísa, sobe,

sobe que sobe, sobe a calçada.

segunda-feira, 12 de abril de 2010

O dia em que juntei Bocage, Celia Cruz e um informático.

Era dia de ligações improváveis.
Era dever de cada um levar a sua.
Uma ideia prévia irrompeu-me a mente, levar o relato do momento em que, Português, a trabalhar na Bélgica, almocei na Alemanha com um Dinamarquês, residente em Londres, colega de um Brasileiro com quem tinha uma vez jantado, em Kent, nos tempos que vivi em França.

Mas... seria apenas o relato de um momento... ainda que o representasse, o mais provável seria ter pouca pontuação na encenação e impacto visual. Para não falar que já o tinha vivido, prejudicar-me-ia também a improbabilidade. Queria fazer boa figura!

Decidi então partir.
Saí do Lima, atravessei Douro, Mondego e Tejo, parei em Setúbal. Levaria o seu mais distinto representante! "Onde queres ir Manuel?", perguntei-lhe. Leva-me a voar, nunca o experimentei em vida, atravessemos o oceano, leva-me à cidade das colunas, mostra-me a sua catedral e a sua praça, o seu capitólio, o encanto das suas avenidas. "E quem traremos de lá?" A Celia, claro! Se é para fazer boa figura, levemos a Rainha!

Regressámos em cima da hora, tinhamos já pouco tempo até ser a nossa vez. Um informático. Pedi-lhe para se juntar a nós, vir também.

Ay, no ha que llorar, que la vida es un carnaval,
es mas bello vivir cantando.
Oh, oh, oh, Ay, no hay que llorar,
que la vida es un carnaval
y las penas se van cantando...

era Celia que irrompia pelo palco, cantava, dançava, vibrava... oh oh oh ay... o público levanta-se e aplaudia de pé, a rainha da salsa retirava-se deixando-nos todo o seu eterno açucar

Se é doce no recente, ameno Estio
Ver toucar-se a manhã de etéreas flores,
E, lambendo as areias, e os verdores...

tinha ainda frescos os seus poemas, declamou um, depois outro, mais outro, parou de repente, pediu um café, o "dele", de sempre, aHH! espanto! eram agora frases que o substituíam! os eternos pacotinhos amarelos tinham perdido o seu rosto!

Entrou em cena o informático, confusão, estranheza, olhares que se cruzaram, ombros que se encolheram, sobrancelhas que se franziram, inquietaram-se as mentes, falou de complexidades, teorias, semânticas, pelo meio, de permeio, de açúcar sintáctico!

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Contemplating the Void


Contemplating the Void é uma iniciativa do Museu Guggenheim NY que reuniu cerca de duas centenas de propostas para um novo viver da sua rotunda. Entre as propostas recolhidas, dois Portugueses, Paulo David e Álvaro Siza Vieira; roubo do Público as descrições de ambos do seu trabalho; acrescento as ligações directas onde os encontrar.

[...]a proposta de Álvaro Siza não acrescenta, não exacerba, não manipula ao ponto de tornar o espaço original irreconhecível. "Ele é de uma tal beleza", diz por telefone. "Não ia fazer essa maldade." O arquitecto português propõe a colocação de um espelho gigante de curvas reentrantes, invertidas em relação às da espiral de Wright, no átrio do museu. O espelho reflecte a parte de cima do edifício - a cúpula de cristal -, como se o virasse do avesso.
Comparada com outras, a intervenção de Siza parece um caso de humildade: reforça o que já existe, originalmente, no espaço. "Não gosto muito dessa interpretação de humildade", defende o arquitecto. "Gostaria de ser humilde em absoluto. Não é verdade. Por outro lado, é extremamente ambicioso porque [a minha proposta] permite reforçar o ideal que está presente naquela obra - o de um espaço total, sem princípio nem fim." Álvaro Siza explica que quem entra naquele edifício "tem a sugestão da esfera", "uma impressão de totalidade". Claro que a continuidade total não é possível: "Quando chega lá acima, a rampa termina de forma quase frustre", nota, "vai por ali fora e de repente faz uma curvazinha e acaba". Mas o seu jogo de espelhos contraria isso, completa esse ideal de totalidade.


Paulo David define a sua intervenção como "um gesto muito simples". Através de uma projecção de vídeo, propõe escurecer o interior do edifício até obter uma luz azul, "como se estivéssemos num ambiente submerso". Ao mesmo tempo, o lado exterior do corrimão da rampa é convertido num ecrã sobre o qual é projectado um feixe de luz que percorre toda a espiral. Paulo David explica que a ideia lhe foi sugerida pela dinâmica descendente da espiral, que evocou nele "um grande movimento de água". A par disso, inspirou-se noutra obra referencial de Wright com uma forte presença da água: a Casa da Cascata, construída em 1937, na Pensilvânia. Assume que não quis fazer uma intervenção arquitectónica. "O que nos entusiasmou aqui foi não ser arquitecto. Usar o edifício para uma intervenção artística." E diz que parte do mesmo gesto que Siza: a sua proposta é "realizável, mas não toca no edifício." "Há um carácter de respeito e de atenção ao próprio edifício. Uma espécie de pisar leve."

Porque vale a pena uma visita, todo o projecto aqui.

domingo, 21 de março de 2010

Yo cambio la primavera


Pido Silencio
Pablo Neruda

"Ahora me dejen tranquilo, Ahora se aconstumbren sin mi.
Yo voy a cerrar los ojos.
Y solo quiero cinco cosas, cinco raices preferidas.

Una es el amor sin fin.
Lo segundo es ver el otoño.
No puedo ser sin que las hojas vuelen y vuelvan a la tierra.
Lo tercero es el grave invierno, la lluvia que ame, la caricia del fuego en el frio silvestre.
En quarto lugar el verano redondo como una sandia.

La quinta cosa son tus ojos.
Matilde mia, bienamada, no quiero dormir, sin tus ojos,
No quiero ser sin que me mires
Yo cambio la primavera, porque tu me sigas mirando.

Amigos, eso es cuanto quiero, es casi nada y casi todo.

Ahora si quieren se vayan.

No sera pues sino que adentro de mi crecean cereales,
primero los granos que rompen la tierra para ver la luz,
pero la madre tierra es oscura, y dentro de mi soy oscuro,
soy como un pozo en cuyas aguas la noche deja sus estrellas
y sigue sola por el campo.

Se trata de que tanto he vivido que quiero vivir otro tanto.
Nunca me senti tan sonoro,
Nunca he tenido tantos besos.
Ahora, como siempre, es temprano.
Vuela la luz con sus abejas.
Dejenme solo con el dia.
Pido permiso para nacer."

domingo, 31 de janeiro de 2010

Pour savourer...

C’est né comme un livre, sous chapitres forme un beau poème…

La Première Gorgée de Bière
et autres plaisir minuscules
Philippe Delerm 

Un couteau dans la poche
Le paquet de gâteaux du dimanche matin
Aider à écosser des petits pois
Prendre un porto
L'odeur des pommes
Le croissant du trottoir
Le bruit de la dynamo
L'inhalation
On pourrait presque manger dehors
Aller aux mûres
La première gorgée de bière
L'autoroute la nuit
Dans un vieux train
Le Tour de France
Un banana-split
Invité par surprise
Lire sur la plage
Les loukoums chez l'Arabe
Le dimanche soir
Le trottoir roulant de la station Montparnasse
Le cinéma
Le pull d'automne
Apprendre une nouvelle dans la voiture
Le jardin immobile
Mouiller ses espadrilles
Les boules en verre
Le journal du petit déjeuner
Un roman d'Agatha Christie
Le bibliobus
Frous-frous sous les cornières
Plonger dans les kaléidoscopes
Appeler d'une cabine téléphonique
La bicyclette et le vélo
La pétanque des néophytes